Drama
Nota: Para outros significados, veja Drama (desambiguação).
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Literatura |
No campo da arte, a palavra drama contém múltiplos significados. Segundo os dicionários Houaiss e Aulete, "drama" pode significar: "forma narrativa em que se figura ou imita a ação direta dos indivíduos", "texto em verso ou prosa, escrito para ser encenado" ou mesmo a "encenação desse texto". Por analogia, pode ser, ainda, "qualquer narrativa no âmbito da prosa literária em que haja conflito ou atrito", podendo ser conto, novela, romance etc., ou mesmo toda a arte dramática.
O termo é também encontrado no cinema, na televisão, no rádio, significando um texto ficcional, peça teatral ou filme de caráter "sério", não cômico, que apresenta um desenvolvimento de fatos e circunstâncias compatíveis com os da vida real.
Na vida cotidiana, um conjunto de acontecimentos complicados, difíceis ou tumultuosos pode ser um drama, assim como um acontecimento que causa dano, sofrimento, dor. Mas estes são apenas alguns dos significados mais conhecidos.
Índice
1 Origens
2 Ingarden
3 Ver também
4 Referências
5 Ligações externas
Origens |
Originou-se na Grécia Antiga significando "ação" (δράω). Aristóteles, em sua Poética, classifica a literatura de sua época, que se originara da forma oral, nos seguintes modos: narrativo ou épico, dramático e misto. A partir desta análise, central em toda a análise dos gêneros literários até os dias de hoje, teóricos dividiram a literatura nos modos narrativo, dramático e lírico.[1]
Significando "ação" em grego, a palavra "drama" vem associada à representação teatral na Poética de Aristóteles, por aí se distinguindo da epopeia, outra forma literária igualmente assente na imitação (mimesis) de ações. Sendo esta obra aristotélica fundamentalmente uma poética do drama, é sobretudo da definição sobre o conceito de tragédia que mais se ocupa, referindo o espetáculo (opsis) como o seu modo de imitação, e sendo os restantes cinco elementos que a compõem: a fábula (mythos), os caracteres (ethos) e o pensamento (dianoia) - como constituindo a sua matéria; a elocução (lexis) e o canto ou música (melos) configurando o seu meio de imitação.
Desde cedo, portanto, na teoria e na prática (da Grécia antiga), o drama surge nesta dupla articulação - com a literatura (escrita) e com o teatro (espetáculo) - embora a natureza, o sentido e a função desta articulação tenham posteriormente variado de acordo com os tempos, as práticas artísticas e as proposições (e avaliações) estéticas. Decorrem no campo literário: nas relações que se estabelecem entre os diferentes modos e gêneros; e decorrem no campo do teatral: do que se entende ser a especificidade deste e do grau de intercepção que pode (ou não) operar na matéria literária, bem como da arquitectura teatral e dos códigos de representação cênica dominantes.
Ingarden |
Dada a permanência histórica do teatro desde os gregos antigos, e as suas formas artísticas posteriores (cinema, rádio, teatro) provenientes do século XX, "drama" é geralmente entendido como um texto escrito para teatro, graficamente registrando a diferença entre didascálias (ou indicações cénicas) e réplicas (ou falas das personagens), o que, na opinião de Roman Ingarden (Das , 1930: 1ª ed., 1960: 2ª ed., 1965: 3ª ed.), organiza, respectivamente, o texto secundário e o texto primário. Enquanto este se manifesta na elocução dos atores, o primeiro usa códigos não verbais, como gestualidade, mímica, coreografia, música, adereços, maquiagem (ou caracterização), cenografia, luminotecnia etc.
Esta histórica separação dual entre as Didascálias e tudo o que seria texto "fala da personagem" vem, na contemporaneidade, reiterando importantes avanços. Modificações conceituais no campo da Arte nos dão exemplos de textos dramatúrgicos em que: ou esta separação não existe, ou as indicações (didascálias) estão acopladas, inseridas no exato corpo do texto, compondo a dramaturgia, modificando, assim, estrutural e conceitualmente, os limites conceituais e estruturais do drama.
Exatamente a partir do século XVIII, com Nivelle de la Chaussée, Diderot (Entretiens sur Le Fils Naturel, 1757) e Voltaire - o drama conformou-se, porém, num género específico de texto "sério" para teatro, que procurava ultrapassar a distinção clássica entre tragédia e comédia, conjugando aspectos característicos de ambos (em termos de personagens e tipos de ação), e criando, deste modo, um universo mais próximo dos interesses, gostos e preocupações de um novo público, burguês, que constituía o que então se designava por terceiro estado. Em Portugal, surgiu para designar uma obra de teatro, como o Teatro Novo de Correia Garção (1760), e dez anos mais tarde a sua Assembleia ou Partida, generalizando-se depois, como designação menos restritiva, nos últimos anos do século. Foi posteriormente conceito fulcral do teatro romântico com Victor Hugo e, entre nós, com Almeida Garrett, por unir o grotesco e o sublime, prescindir do verso, adotar a linguagem do quotidiano, preferir a matéria histórica e enaltecer o sentimento e a liberdade individual, entre várias outras características.
Na sua relação com a literatura em geral, o drama vem referido ao modo dramático, compondo, juntamente com o lírico e o épico (ou narrativo), a tríade que foi, a partir do Renascimento e durante algum tempo, incorretamente atribuída a Aristóteles. Trata-se, com efeito, de uma elaboração teórica posterior à sua poética, mas tem sido a mais repetidamente glosada, embora seguindo diferentes critérios para a sua repartição, bem como para o reconhecimento do sentido e valor dos seus componentes.
Na confrontação com os outros dois modos literários, o dramático tem sido ora menorizado, ora engrandecido. Menorizado porque entendido como incompleto sem a realização cênica e, por isso, simples guião ou rascunho sem existência autónoma, ou então porque nele participam elementos não puramente literários, configurando, portanto, um caso-limite da obra literária. Mas poetas como John Keats ou T.S. Eliot, advogando, em tempos diferentes e por razões e modos não absolutamente idênticos, a impessoalidade da poesia, defenderam a importância da articulação de uma outra voz que não a assumida expressão direta do sujeito poético, definindo, por isso, a superioridade do dramático. Não significa, porém, que considerassem a escrita de peças como o único processo de realização do dramático, antes admitiam que ele pudesse e devesse invadir o campo tradicional do lírico.
Neste sentido, torna-se clara a variabilidade de critérios de definição e de avaliação dos modos literários, o que não impede o reconhecimento de um modelo mais ou menos geral de realização do dramático, que constitui a sua definição convencional, embora tenha permitido (como é regra de qualquer "contrato") a sua repetida transgressão e reformulação.
Elementos como personagens, diálogos e ação (referida esta ao conflito ou colisão de forças quer externas, quer internas às personagens) são, nessa conformidade, os elementos básicos de um universo ficcional que, diferentemente do narrativo, é composto para ser representado em palco. Por razões que se prendem com essa vocacionalidade cénica e com as normais expectativas de um público quanto ao tempo de duração de um espectáculo, a ação é geralmente mais concentrada (do que numa narrativa), o que não implica forçosamente a aceitação da "regra" das três unidades (de ação, tempo e lugar), lei esta supostamente aristotélica, mas de fato de fabricação renascentista, e dominante sobretudo na composição do drama neoclássico.
Essa ideia de concentração condiciona, de algum modo, a intensificação do conflito, o que favoreceu a ideia de que o drama representa exemplarmente, e de forma objectiva, uma colisão de forças e uma situação de crise e exaltação, como o definiram Hegel (Äesthetik, 1820-1829, edição póstuma em 1835) e Etienne Souriau (Les deux cent mille situations dramatiques, 1950). Este último posiciona, por isso, o drama entre a vida e a consciência, como momento de entrevisão de forças obscuras que as figuras estruturais presentes no microcosmos da peça deixam pressentir, enquanto Hegel localiza na tragédia a colisão de direitos e valores opostos mas igualmente legítimos. Outros consideram que o drama é uma forma privilegiada de comentar a natureza humana, pelo que por ele o homem se engrandece ao adquirir uma consciência mais lúcida (Pierre Aimé Touchard, Le théâtre et l’angoisse des hommes, 1968), ao identificar um pronunciamento a respeito das relações entre os homens (Ronald Peacock, The Art of Drama, 1957) ou ao reconhecer nele aspetos fulcrais definidores de uma determinada cultura (Francis Fergusson, The Idea of a Theater, 1949).
Para além do sentido e valor que ao dramático podem assim ser atribuídos, há ainda a considerar os aspetos formais que se prendem à sua definição convencional e que, necessariamente, se foram relacionando com a arquitetura da cena e modos de funcionamento do sistema teatral (condicionando a sua função social e os códigos quer de representação dos atores, quer de configuração do lugar cénico, por exemplo), bem como com modelos composicionais que os diferentes tempos, escolas e estilos foram praticando. Estes abrangem elementos como o decoro (seguindo as razões de Aristóteles e os preceitos de Horácio na sua Arte Poética), a peripécia e a catástrofe, o coro, a presença de um Prólogo e Epílogo no início e fim do espetáculo, o solilóquio, o aparte, o quiproquó, o efeito de distanciação (ou estranhamento) etc., mas também se reportam aos variadíssimos géneros e subgéneros que o dramático foi consentindo: tragédia, comédia, drama satírico, drama litúrgico, entremez, tragicomédia, sátira, drama histórico, farsa trágica, comédia de costumes, comédia lacrimosa (larmoyante), melodrama, vaudeville, comédia de bulevar, comédia-bem-feita, drama estático, music hall, teatro épico (decorrente da teorização de Erwin Piscator e Bertolt Brecht), comédia negra, farsa absurda, entre vários outros modelos.
Se, no campo do literário, o jogo de repartição e avaliação (de modos e géneros) oscila desta maneira, idêntica hesitação encontramos no campo do teatral quando se confronta o texto com os outros elementos que compõem o espetáculo. Sabemos que os momos medievais, os improvisadores quinhentistas da comédia dell'arte, os atores de pantomima, os participantes de happenings e de teatro de rua nos anos 60 do século XX, ou de outras formas de teatro visual e performances, não obrigam à existência de um texto fixo para se dizer em cena, mas apenas a apontamentos, roteiro ou cenários que serão desenvolvidos (com maior ou menor grau de improviso) no decurso do espetáculo. Todavia, a tradição erudita do dramático no teatro ocidental privilegiou o elemento literário (numa clara tendência logocêntrica visível já em Aristóteles), o que só veio a ser contestado no momento em que surgiu com alguma autonomia a figura do encenador, no final do século XIX.
Assim, Edward Gordon Craig (On the Art of the Theatre, 1911) defendia uma arte do teatro verdadeiramente criadora e não apenas uma técnica interpretativa de textos, visionando à criação de obras primas teatrais a partir de elementos cénicos de que o espetáculo dispõe, pela conjugação da ação (o trabalho interpretativo do ator), das palavras (o corpo da peça), da linha e da cor (o específico da cena) e do ritmo (a essência da dança). E, num idêntico sentido de valorização do cénico, propôs, Antonin Artaud, um "teatro de crueldade" (Le théâtre et son double, 1938), argumentando em favor das potencialidades visuais e expressivas do teatro, recusando a primazia da literatura e da palavra e sobrevalorizando a fisicalidade do ator, para melhor cumprir a sua visão de um teatro metafísico.
Ver também |
- Cinema
- Comédia dramática
- Melodrama
- Dramaturgia
- Teatro
- Teoria da literatura
Referências
↑ «Gênero Dramático». BrasilEscola.com
Ligações externas |
- E-Dicionário de termos literários editado e organizado por Carlos Ceia. Verbéte de Maria Helena Serôdio
- A perversão dos gêneros por Almodóvar
Drama films (em inglês)